
Mal
pronunciou a frase, os olhares desconfiados se voltaram para ele. "Era
como se dissessem: "todo pai fala isso"", lembra Daniel Eustáquio de
Oliveira. Mas o eletricista de 50 anos estava disposto a provar que o
filho, César, não era bandido. Ao longo de 28 dias, mesmo em luto pela
morte do garoto de 20 anos, o homem coletou provas e arriscou-se atrás
de testemunhas até conseguir mostrar aos investigadores as
inconsistências da versão apresentada pelos policiais militares. Pela
história oficial, César e um amigo de infância, Ricardo, morreram ao
trocar tiros com os agentes, em uma perseguição em São Paulo, em julho.
As informações levantadas por Daniel apontaram, entretanto, que os dois
foram covardemente assassinados. Seis PMs estão presos desde o início
deste mês. Não fosse a obstinação de um pai, César e Ricardo teriam
engrossado uma grave estatística no país: a dos mortos em confronto com a
polícia. Foram 756 no Brasil em 2010 — aumento de 935% em uma década,
segundo os registros do Sistema de Informação de Mortalidade do
Ministério da Saúde. Também notificadas como autos de resistência, essas
mortes não passam por qualquer investigação, sob a premissa de que o
policial agiu em legítima defesa. César, Ricardo e tantos outros
mostram, porém, que o expediente serve para disfarçar execuções sumárias
cometidas por fardados. Para coibir a violência policial, o Ministério
da Justiça (MJ) elaborou uma minuta de projeto de lei sobre o assunto
para encaminhar ao Congresso Nacional. A ideia, segundo o secretário de
Assuntos Legislativos da pasta, Marivaldo Pereira, é modificar o Código
de Processo Penal para tornar claro que, se a resistência resultar em
lesão corporal grave ou morte, é preciso abrir uma investigação.
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