farmacia santanaÀs 15h30 do dia 31 de janeiro de 2018, Fábio Barreto Pereira trabalhava normalmente. Até que, pela porta da Farmácia Sant’Ana da Manoel Dias da Silva, na Pituba, entraram dois homens e uma mulher. Premonizou o que viria e se apressou para encontrar os oito colegas. Do trio, receberam juntos a notícia temida há meses: a loja seria fechada e todos estavam demitidos. O final de janeiro foi escolhido da Brasil Pharma para anunciar o fechamento de 46 das 114 lojas daquela que foi a maior drogaria da Bahia, e os oito eram apenas uma pequena parcela dos 584 já demitidos pela rede no estado.
Ali, atônitos em frente aos três mensageiros, relembraram as constantes reclamações de clientes como prenúncio do inevitável. “Eles diziam que estava faltando coisa em estoque, e realmente estava. O clima estava tenso”, conta Fábio, ex-gerente que dedicou 10 dos 37 anos à Farmácia. Os próprios empregados não entendiam a falta de produtos nas prateleiras antes cheias. Sabem apenas que a crise começou em 2015, ano em que foram avisados sobre um problema de fornecimento de produtos. E que a situação, conforme passavam os dias, ficava insustentável. “Às vezes, nem soro fisiológico, uma coisa que é básica, tinha”, acrescenta.
Dois anos depois, em abril 2017, um sinal de sobrevida: a Brasil Pharma, controladora da rede desde 2012, iniciou uma operação emergencial de abastecimento, com a campanha chamada “Tá na Santana”, uma alusão às reclamações. Mas, o sossego durou muito pouco.
No dia 10 de janeiro deste ano, a holding ajuizou na Justiça de São Paulo um processo de pedido de recuperação judicial. Na prática, significava que o grupo, endividado em R$ 1,2 bilhão com o banco BTG Pactual, não conseguiu resolver os problemas financeiros. Era a resposta que faltava ao porquê dos estoques vazios e o início de um novo capítulo para a Sant’Ana.
Comprada pela empresa em fevereiro de 2012, a farmácia não teve como sair ilesa de medidas geralmente adotadas durante a fase de recuperação judicial, como demissões. A lei, explica o advogado e especialista no trâmite Rodrigo Accioly, é utilizada para que grupos “em quadro de endividamento muito forte” criem estratégias de recuperação fiscal. “Esse plano vai dizer: eu vou pagar os credores trabalhistas em tal tempo, despedirei tantas pessoas, fecharei tantas lojas. Isso com base no cenário do mercado que a empresa atua”, detalha.
As demissões de funcionários da farmácia, no entanto, aconteceram nos dias 30 e 31 de janeiro de 2018, antes mesmo da apresentação final do plano, prevista para o dia 10 de março. O que não significa ilegalidade, já que uma empresa em fase de recuperação pode e deve funcionar normalmente, ressalta Accioly. Ocorre que, a partir do dia do deferimento do pedido, as corporações têm um prazo de 60 dias para apresentar o plano final. Antes disso, desde que não haja destruição do patrimônio ou pagamentos indevidos, a empresa em recuperação pode agir como queira.
farmacia santana 2Unidade das Mercês, a primeira que deu início à rede, coberta com tapumes (Foto: Mauro Akin Nassor/CORREIO)
O resultado da decisão já é visível nas 10 regiões baianas onde a farmácia tinha sedes. Delas, que incluíam as cidades de Feira de Santana e Vitória da Conquista, apenas as 60 drogarias localizadas entre Salvador e Lauro de Freitas sobrevivem. A capital e região metropolitana registraram juntas o maior número de demitidos: ao todo, foram 360 pessoas desligadas. Na Bahia, dos 584 demitidos, 478 são funcionários varejistas (balconistas, caixas e estoquistas) e 106 farmacêuticos. Até março, podem haver novas ações, mas o mistério que circunda os próximos passos é mantido.
A principal preocupação dos ex-funcionários é, mais do que antever o futuro de colegas e da Sant’Anna, saber quando e se serão pagos por uma empresa em crise. A proposta da Brasil Pharma é pagar 70% do valor corresponde aos custos das rescisões. Os funcionários do varejo, representados pelo Sindicato dos Trabalhadores em Farmácia e Similares (Sintfarma), aceitaram o acordo e devem ser pagos até o dia 5 de março de 2018. Somada, a quantia chega a R$ 3,7 milhões. “Muitos funcionários não têm outros meios de sobreviver. Então, antes acertar uma parte do que terminar sem nada”, justifica o advogado da entidade, Carlos Henrique. (Fonte: Correio)